A astrologia é um estudo milenar que vem ganhando destaque como ferramenta de autoconhecimento e conexão com o universo. No entanto, grande parte das interpretações e práticas astrológicas populares ainda estão enraizadas em paradigmas eurocêntricos. A astrologia decolonial surge como uma resposta a essa perspectiva limitada, resgatando as cosmovisões dos povos do Sul Global e ampliando o olhar sobre a relação entre o céu e a Terra.
Neste texto, você vai descobrir como o pensamento decolonial pode enriquecer sua prática astrológica, revelando que o céu não é o mesmo para todos.
Para começar, o que é Pensamento Decolonial?

Decolonialismo ou pensamento decolonial é um campo de pensamento que questiona e desconstrói as estruturas de poder e conhecimento impostas pelo processo de colonização e suas consequências.
A escola de pensamento decolonial, que tem raízes na América Latina com autores como Aníbal Quijano, Walter Mignolo e Maria Lugones, propõe que o colonialismo não se restringiu à ocupação territorial, mas também colonizou mentes, epistemologias, subjetividades e formas de construção do pensamento. Sob essa lógica, podemos falar sobre pensamento decolonial em todos os assuntos, incluindo espiritualidade e astrologia.
Esse processo de colonização resultou na marginalização de saberes ancestrais e na imposição de uma visão de mundo eurocêntrica, que impede a manutenção das tecnologias ancestrais e saberes dos povos do sul global.
O que sabemos hoje é que o céu não é o mesmo para todos e falar sobre decolonialismo na astrologia é uma oportunidade de abrir espaço para a pluralidade de cosmovisões que compõe o mundo.
O que é Astrologia Decolonial?
Astrologia decolonial é uma abordagem que reflete as narrativas hegemônicas da astrologia tradicional, resgatando saberes ancestrais e valorizando as formas como os povos indígenas, africanos, asiáticos e latino-americanos se relacionavam com o céu. A astrologia, como compreendemos hoje, parece ter uma única raíz: a grego-romana. Essa concentração de saberes no norte global, muitas vezes abafa a vasta cultura astronômica e astrológica que temos por exemplo, em nosso continente latino-americano.

Quando aplicado à astrologia, o decolonialismo nos leva a questionar:
- Por que priorizamos sistemas astrológicos eurocêntricos?
- Quais cosmologias foram apagadas ou esquecidas?
- Como podemos integrar visões diversas em nossa compreensão do cosmos?
Astrologia decolonial x Astrologia eurocentrada
A astrologia como conhecemos hoje, foi amplamente sistematizada na Europa durante a Idade Média e o Renascimento, influenciada pela filosofia grega e romana. Você já parou para pensar que todos os símbolos astrológicos têm nomes greco-romanos? Vênus, Júpiter e até asteroides como Quíron são exemplos de derivações das mitologias gregas e romanas. Essa visão mais “conhecida” da astrologia promove dois desafios:
1- Origem multicultural abafada: Embora a astrologia ocidental seja amplamente creditada à Grécia e Roma, suas bases vieram de povos antigos como os mesopotâmicos e sumérios. Esses saberes foram apropriados e reformulados ao longo da história.
2- Visão limitada do cosmos: A astrologia eurocêntrica reflete apenas uma perspectiva cultural, deixando de lado interpretações valiosas de outros povos.
“Os Incas por exemplo, grandes astrônomos da América do Sul, chamavam a constelação de sagitário de LLAMA (Lhama), por que era o animal mais parecido com a constelação que eles tinham contato. Em Ollantaytambo, existe um templo construído em formato desse animal, em homenagem ao céu”

A astrologia decolonial não desqualifica o conhecimento astrológico ocidental, mas questiona sua hegemonia!
Saberes ancestrais e astrologia decolonial
É impossível constatar que um único povo deu origem a astrologia. O estudo que nasceu em muitos berços civilizatórios faz parte do desenvolvimento histórico de muitos povos. Cada cultura desenvolveu uma relação única com o céu, moldada por sua geografia, espiritualidade e necessidades práticas:
Povos Andinos e o Cruzeiro do Sul
Para os povos dos Andes, o céu e a terra são uma continuidade. A Via Láctea, chamada de Mayu (rio celestial), era usada para orientar os ciclos agrícolas. A constelação do cruzeiro do sul também é uma referência representada na mitologia de muitos povos, e só é visível no sul global.
Dogons e o segredo de Sírius
Na África Ocidental, o povo Dogon possui um conhecimento astronômico avançado, incluindo detalhes sobre Sírius B, uma estrela invisível a olho nu. Seu entendimento do cosmos está profundamente conectado a mitos de criação e práticas espirituais.
Maias e os ciclos cósmicos
Os Maias criaram calendários altamente precisos baseados nos movimentos do Sol, da Lua e dos planetas. Para eles, o céu não era apenas um relógio, mas um guia espiritual que conectava as ações humanas aos ciclos universais e infindáveis.
Aborígenas e as constelações escuras
Diferente do olhar ocidental, os aborígenes australianos também observavam o espaço vazio entre as estrelas, criando narrativas míticas baseadas nas sombras que se formavam na Via Láctea.
Tupi-Guarani e a integração com a natureza
No Brasil, povos originários como os Tupi- Guaranis possuem mitos que conectam constelações com seus ciclos de vida e as forças da natureza.
Como resgatar esses saberes astrológicos na prática
Antes de pensar em como, devemos nos perguntar “porquê”. Ao integrarmos diferentes visões de mundo, reconhecemos que o céu, assim como a vida, é tão plural quanto as culturas que os contemplam. Chimamanda Ngozi escreveu em seu livro – o perigo de uma história única, a seguinte frase:
“Nossas histórias se agarram a nós. Somos moldados pelo lugar de onde viemos”
- Estude cosmologias ancestrais: Leia sobre como os povos originários da sua região interpretavam o céu. No Brasil, por exemplo, muitos povos indígenas possuem histórias fascinantes sobre constelações como a Ema e o Veado.
- Reflita sobre sua relação com o céu: Como o ambiente em que você vive influencia sua percepção das estrelas? Quais ritmos naturais regem a sua vida? O que mesmo em um mundo intensamente conectado com a tecnologia, nos relembra de onde viemos?
- Adote uma visão integrativa: Combine o que você já conhece da astrologia ocidental com saberes ancestrais. Isso enriquece sua prática e permite uma compreensão mais realista.
Um breve relato sobre como viajar me aproximou de outros céus



“Em um mundo estático, conhecemos aquilo que nossas fontes nos apresentam. Nossa realidade é moldada através do que nos rodeia e não, do que nos atravessa. Ao viajar, nos conectamos com outros mundos e conhecemos novas visões sobre o céu e a Terra. Ao viajar pela América Latina, tenho me conectado com histórias e fontes antigas que ampliaram minhas crenças no céu. Viajar pelo sul global é descobrir que a astrologia não se limita a uma história única: Os Maias, Incas, Tupi-Guaranis e tantos outros povos, são uma parte importante da história do que hoje é minha profissão, ainda que essa história tenha sido abafada pela colonização. É preciso estudar através de outras referências: e as vezes, só é possível quando nos abrimos para conhecer novos mundos. “
Se você deseja explorar a astrologia decolonial e integrar essa visão em sua jornada, continue acompanhando o blog Asas e Raízes para mais reflexões, práticas e saberes que conectam o céu e a terra de forma plural e consciente.